Não se pretende fazer aqui crítica literária. Sou um cidadão do mundo que sente amor natural pelos livros. Na minha casa as paredes estão cobertas pelos livros. E falo com eles ou melhor eles falam comigo como se fossemos grandes amigos. Revelam-me os seus segredos e os conhecimentos dos seus autores ou contam-me histórias onde se inscrevem valores humanitários universais.

São ensaios, romances, contos e narrativas, peças de teatro, clássicos e modernos, mas também sobre o ambiente ou tecnologias úteis no nosso dia-a-dia. São obras que fazem parte da minha paixão pelos livros e que humildemente indicamos como sinal e guia para quem deseje conhecer conteúdos que julgamos dignos e fiáveis.

E porque desejo transmitir uma análise que embora pessoal seja minimamente correcta nem sempre consigo manter a actualidade que seria normal se a falta de tempo por abraçar outras actividades não o impedisse. Mas aqui estarei sempre que possa.

Gil Montalverne


O CADERNO - 2
José Saramago
Editorial Caminho

Esta colectânea dos textos escritos por Saramago no seu blog entre Março e Novembro de 2009 mais uma vez confirmam o que já tinha dito em relação ao seu Caderno editado 1 ano antes com aqueles que marcaram o início da sua adesão à blogosfera em Setembro de 2008. Aliás ele transferiu precisamente para este suporte as crónicas, críticas e análises do quotidiano que tinha iniciado nos seus Cadernos de Lanzarote quando para ali se mudou na sequência da censura ao livro O Evangelho Segundo Jesus Cristo para o Prémio Europeu da Literatura. Lembremos que ele próprio confessava então tratar-se de uma espécie de Diário que tinha prometido escrever num caderno de papel reciclado que para o efeito lhe tinha sido oferecido numa visita dos seus cunhados María e Javier. E assim foi de facto. O escritor passou a transmitir para o papel as suas preocupações, mesmo as mais íntimas, dando-nos a oportunidade para o conhecer ainda melhor, fora da grande criatividade dos seus romances mais que consagrados, todos eles conduzindo afinal ao desfecho evidente de alcançar em 1998 o Prémio Nobel da Literatura. Mas debruçando-me mais sobre este segundo Caderno, confesso ainda maior admiração que aquela que já sentia pelo Homem Saramago. Com uma simplicidade extraordinária, o grande escritor despe as suas mais características vestes literárias para com a mesma clareza de princípios humanísticos nos oferecer o teor das preocupações que afinal todos deveriam sentir nesta aldeia global em que estamos a passar os nossos dias. Acreditem os que eventualmente me estão a ler que desejo declarar com toda a humildade possível que eu próprio me senti desejoso de assinar por debaixo de cada um daqueles textos diários. Que me desculpem portanto a ousadia. Claro que muitos dos casos referidos e que foram primitivamente colocados no seu blog não poderiam estar no meu pensamento. O que pretendo dizer é que de tal modo me impressionaram que eu desejaria tê-los pensado e isso é quanto basta para sentir o enorme prazer de os descobrir nesta leitura de um Saramago, extremamente humano e totalmente longe daquela figura que tantas vezes é injustamente atacada. E isso principalmente porque ele tem a coragem de expor as suas ideias pouco concordantes com as dos seus inimigos políticos e religiosos. Claro que também aqui ele não deixa de as revelar com a mesma ou ainda maior honestidade com que sempre o faz. Também aqui se revolta contra a opressão, a tortura, a burguesia corrupta e a mesquinhez, as ditaduras de toda a espécie que pululam em várias partes do globo, enfim tudo aquilo que contraria os direitos do homem e a liberdade. E também aparecem as suas críticas a uma religião que não respeita ela própria aquilo que diz defender. Mas a força principal do Caderno de Saramago reside - e não me canso de o repetir - na grandeza dos princípios que defende e que Umberto Eco muito bem define no prefácio que escreveu para a edição italiana: “ eu diria que nestes breves escritos Saramago continua a fazer a experiência do mundo tal como ele é, para depois o rever a uma distância mais serena, sob a forma de moralidade poética (e às vezes pior do que é – embora pareça impossível ir mais longe)”“para não falar (e eis o retorno aos grandes temas da sua narrativa) de quando da análise do quotidiano salta para os grandes problemas metafísicos, para a realidade e a aparência, para a natureza da esperança, para como são as coisas quando não estamos a olhar para elas.” Que razões mais necessitaria eu para colocar o Caderno de Saramago no meu Amor Pelos Livros?

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MANÍACOS DE QUALIDADE
Joana Amaral Dias
A Esfera dos Livros

“Portugueses célebres na consulta com uma psicóloga” é o subtítulo deste livro que justifica de imediato o porquê de existirem maníacos de qualidade. Eles são então célebres e portanto é suposto neles existir qualquer espécie de qualidade, seja ela cultural, política ou social. Mas ao mesmo tempo neles existem ou melhor foram reconhecidos no seu tempo pequenos ou grandes distúrbios mentais, levando uma vida que muitos analisaram e apelidaram das mais diversas formas. Joana Amaral Dias, figura mediática bem conhecida, licenciada em Psicologia Clínica, docente e terapeuta familiar, com vastos conhecimentos adquiridos pela sua experiência e pela presença assídua nos areópagos da especialidade, resolveu debruçar-se sobre a vida de alguns portugueses que entraram em diversos ramos da nossa história. De todos eles, desde D.Afonso VI(dado como louco), Marquês de Pombal (um obsecado ou desequilibrado) ou a Rainha D. Maria I (considerada doida), mas também Fernando Pessoa (preocupado com a sua sanidade mental), Antero de Quental(que se suicidou) e João César Monteiro (o cineasta excêntrico), alguma coisa portanto sabíamos sobre o seu comportamento mais ou menos estranho. Menos conhecidos como portugueses célebres seriam Ângelo de Lima e António Gancho. Perante uma lista considerável de grandes vultos da nossa história com assinaláveis perturbações psíquicas ou como tal considerados e sentindo a necessidade de efectuar uma escolha que tivesse uma representatividade para a finalidade que se propunha neste seu livro, Joana Amaral Dias decidiu-se por dois critérios. Em primeiro lugar todos eles deveriam possuir “indícios fortes de grande sofrimento psíquico” mas o conjunto escolhido deveria também preencher a necessária “diversidade” que permitisse abranger um vasto leque de uma certa tipologia apelidada por uns de desvios de personalidade e por outros de verdadeira doença psíquica. A loucura é um tema recorrente na história da humanidade sendo até muito comum dizer-se que “de génio e de louco todo o mundo tem um pouco”. Seria natural portanto que figuras mais proeminentes ficassem também conhecidas pelos seus eventuais actos de uma certa loucura. E tudo isso seria igualmente uma classificação de terceiros. A investigação cuidada de Joana Amaral Dias vai mais longe e na impossibilidade de sentar num divã as personagens do livro baseia-se não só nos muitos documentos históricos mas também registos biográficos e mesmo auto-biográficos, diários, cartas, etc. É um trabalho muito honesto e tanto quanto possível correcto sobre a verdade do que foi dito e escrito mas sobretudo – e isso é importante – do que teria sido sentido pelos personagens que chamou para este livro. Em certos casos – e sempre que tal foi possível - eles aparecem mesmo num discurso directo quase parecendo que estamos a assistir a uma sessão de psicanálise. Quase nos permitimos dizer que a autora assim o entendeu de tal modo os vultos estudados nos aparecem nas páginas que oferece à nossa leitura. Nada foi ignorado - ou muito pouco - do que disseram terceiros, que pudesse ter importância para a análise feita. Digamos que esta obra se lê com a consciência de que ficamos mais conhecedores dos actuais conhecimentos sobre o que se passa no universo da mente humana apesar de Joana Amaral Dias nos afirmar que poderão existir alternativas às interpretações apresentadas. No entanto, quanto a nós, este estudo sobre alguns “Maníacos de Qualidade” que fazem parte da nossa História contribui firmemente para o nosso enriquecimento cultural. E por isso aconselhamos vivamente a sua leitura.

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