AUSCHWITZ – UM
DIA DE CADA VEZ
Westher Mucznik
Auschwitz nunca mais! É este tipo de frase que apetece dizer, aliás
utilizado em diversas ocasiões quando queremos expressar o nosso desejo de que
determinados acontecimentos não se repitam. E quando neste caso, essa palavra
maldita significa um dos maiores horrores que os homens praticaram, levando ao
sofrimento e à morte de mais de um milhão de pessoas, homens, mulheres e
crianças, vivendo os seus últimos dias – se é que a isso se pode chamar viver –
sujeitos às maiores privações, desde a fome às torturas, espancamentos, sem
qualquer tipo de assistência mas muito deles fazendo parte ainda de diabólicas
experiências médicas, que os conduziam a males ainda maiores, quase duvidamos
que essa gente que originou o gigantesco holocausto, na tentativa de destruir
os que não eram da sua “raça” ariana, eliminando sobretudo judeus e ciganos,
pudesse pertencer à espécie humana. Nunca na história da humanidade se
perpetraram tais crimes, tão numerosos e com tanta violência. Os relatos que
nos chegaram, através dos sobreviventes, ao longo dos anos que se seguiram à
sua libertação, deram-nos a conhecer a forma como tais crimes eram cometidos, o
que se passava nas câmaras de gás, nos esgotantes trabalhos forçados para
ajudar a força de guerra nazi, nas casernas onde se amontoavam no total
desconforto como se de animais se tratassem, centenas de presos, muitas vezes
sem saber se estariam vivos no dia seguinte. Mas cada testemunho que nos chega,
cada história contada, cada retrato da miserabilidade a que foram sujeitos
esses muitos milhões de seres humanos é sempre algo que nos revolta ainda mais.
Se é que é possível ser maior a revolta que já sentíamos. No passado dia 27 de
Janeiro cumpriu-se mais vez o que está estabelecido para comemorar de 10 em 10
anos a libertação de Auschwitz em 1945. Foi há 70 anos portanto que o Exército
soviético entrou pelo chamado Portão da Morte para retirar os poucos
sobreviventes que ainda ali se encontravam depois dos nazis terem levado a
quase totalidade, muitos deles acabando por morrer nas marchas de retirada.
Nesta cerimónia, que contou com a presença de 11 líderes de países europeus e
delegações de mais de 40 países, assistiu-se pela televisão à forte carga
emotiva com que reagiram naturalmente os cerca de 300 sobreviventes que ali
voltaram para prestar a sua homenagem, muitos deles a familiares e amigos mas
não só, a todas as vítimas que perderam a vida naquele conjunto de campos na região
sul da Polónia. E, tal como foi salientado pelos oradores, os próximos
aniversários não contarão certamente, devido à sua avançada idade, com o número
de sobreviventes que ali estiveram desta vez. Foram as suas vozes e de outros
que já partiram que nos permitiram conhecer até que ponto foi possível tal
capacidade humana para a extrema humilhação, desprezo e genocídio de outros
seres, biologicamente seus iguais mas diferentes nas suas crenças ou religiões.
E é aqui que todos devemos centrar a nossa atenção. É necessário não esquecer,
não esquecer nunca, lembrar nas escolas e nos livros, para que passe de geração
em geração e possamos garantir com toda a certeza: Auschwitz nunca mais! Também
nós próprios desejámos trazer aqui mais um livro que saiu nestes últimos dias
precisamente nesse contexto. Para que não se esqueça. E mais uma vez, reparámos
que afinal ainda não sabíamos tudo. O que a autora, aliás já com outras obras
publicadas sobre Auschwitz, nos faz chegar em relatos não só de certo modo
reunidos pelas características do conteúdo em locais determinados mas também
cronologicamente organizados de modo a ser conseguido um historial dos factos
desde o nascimento destes campos até ao momento da libertação. Perante todo o
potencial de sofrimento e dor é também a luta pela sobrevivência, abortar a
gravidez para não morrer mãe e filho(a), até mesmo escolher entre a morte de
dois ou apenas um, praticando o crime de que mais tarde virão a sentir
remorsos. É reagir por vezes, lutando pelo que parece desnecessário face à
morte anunciada para salvar a faculdade de ser alguém, onde a cada dia em vez
de um “…preferia morrer” (…) decidir “lutar para sobreviver”. Da primeira à
última página, adquirimos uma estranha vivência de tanto sofrimento e tanta
dor, atingindo a suprema humilhação que desce ao mais imundo do carácter de
quem a perpetrou. E o que agora lemos só foi possível porque existem pessoas
como a autora, aliás com responsabilidades em vários organismos que se dedicam
a perpetuar a memória do Holocausto, que responderam ao pedido feito pelos
sobreviventes: “Não nos esqueçam!”. Não esqueceremos nunca, assim o creio. E,
se outras razões não existissem, bastaria isso para dar também este meu humilde
contributo de aqui deixar o convite para que leiam este livro de Esther
Muchznik. Como é hábito vai ser possível proporcionar ao visitante deste espaço
a leitura de alguns excertos dele. E posso afirmar que nunca me foi tão difícil
a escolha. Porque na verdade todo o livro merece ser lido. Há mais, muito mais
para ser conhecido. Bem-haja quem nos permitiu que assim fosse.
Para ler um excerto desta obra clique aqui