SIMONE DE BEAUVOIR
MAL-ENTENDIDO EM MOSCOVO
Com a reedição de “O Segundo Sexo” a
editora lançou também uma célebre novela de Simone de Beauvoir que esteve para
fazer parte da sua colectânea La Femme
Rompue (A mulher
destruída, em português) mas tal não aconteceu e de facto, escrita quase
vinte anos depois da edição em França da sua grande obra, esta pequena novela ajuda-nos
eventualmente a perceber melhor como vivia esta grande escritora, completamente
de acordo (como aliás era de esperar) com as ideias e pensamentos que defendia.
Mal-entendido em Moscovo conta-nos alguns momentos, ou melhor alguns dias,
vividos por um casal de professores reformados, atravessando aquele período de
crise habitual dos muitos anos passados em conjunto. Mas após
as primeiras páginas da sua leitura facilmente depreendemos que ele, André, o
marido, é nem mais nem menos que Jean Paul Sartre e ela, Nicole, é Simone de
Beauvoir. Portanto o desenrolar das diversas situações, numa viagem à União
Soviética, são verdadeiros retratos autobiográficos. E, sem querer sentir algum
pecadilho por entrar na intimidade da vida do casal, o que aliás Simone
certamente, ao escrevê-la, teve a plena consciência de que o estava a permitir,
esta sua novela, riquíssima de diálogos que nos transmitem efusivamente a
maneira de pensar dessas duas grandes figuras, dá-nos a sensação de estarmos
ali a viver com eles, o encontro e o desencontro por palavras ditas ou apenas
pensadas por cada um. Em Moscovo eles têm consigo a presença de Macha que seria
a filha do primeiro casamento de André (Sartre teve várias ligações
nomeadamente com jovens soviéticas não sendo oficialmente garantido que delas
tivesse filhos). Mas na novela, a existência de Macha serve para entre os dois
elementos do casal se instalar o possível ciúme que aliás parece ter sido mais
verídico no caso de Sartre do que de Simone. Nicole também teria – na novela –
um filho chamado Philip que ficara em Paris. Um e outro caso irão ser aproveitados na
novela para a defesa ou ataque, género André: “…nunca pensei que ela te
aborrecia.”. Nicole: “mas é uma terceira pessoa entre nós”. André: “É o que
muitas vezes penso quando trazes o Philip para passar o fim-de-semana
connosco.” Um exemplo apenas do muito que se passa neste Mal-entendido em Moscovo. E também a
desilusão de um e do outro face às diferenças notadas com o que teria sido em
viagens anteriores e esta de agora à então União Soviética, o que de facto também
é auto-biográfico, embora mais de Simone do que de Sartre. Aliás esta óptima
novela prende-nos de tal forma que só paramos no final. Por isso – e não só –
ela aqui está como merece e porque tanto significa do pensamento e vivência da
autora. Bem merece este lugar no meu Amor pelos Livros, ela, Simone de Beauvoir,
que confessava “ter uma paixão violenta pelos livros”. Voltaremos, assim o
creio, a tê-la aqui na esperada reedição de outra obras.
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desta obra clique aqui