Desmontando o mito milenar do "eterno feminino", uma frase estabelece uma ruptura irreversível: "Ninguém nasce mulher, torna-se mulher". A dualidade dos sexos nunca deveria ter levado a que o homem saísse sempre o vencedor sobre a mulher. Simone de Beauvoir e a sua obra muito contribuíram, a par de outras corajosas personalidades, para que este estado de coisas tenha melhorado mas a plenitude da sua razão ainda não foi alcançada. E por isso existem uma série de movimentos feministas, um pouco por todo o lado, até nos países mais radicais do extremo oriente onde a luta prossegue mas onde uma jovem de 17 anos, a paquistanesa Malala Yousafzai, defendendo, entre outros direitos, precisamente os da educação das jovens meninas, lutando até às mais atrozes consequências, consegue obter o Prémio Nobel da Paz em 2014. Todos julgamos e desejamos que esteja em vias de se formar uma nova concepção da sociedade baseada na democracia plena, uma aliança do socialismo e da liberdade. Porque socialismo e liberdade são inseparáveis. E como diz Simone “ uma volta ao passado não é mais possível nem desejável. O que se deve esperar é que, por seu lado, os homens assumam sem reserva a situação que se vem criando; somente então a mulher poderá viver sem tragédia. Então poderá ver-se realizado o voto de Laforgue: "Ó moças, quando sereis nossos irmãos, nossos irmãos íntimos sem segunda intenção de exploração? Quando nos daremos o verdadeiro aperto de mãos?" (…) "Então ela será plenamente um ser humano (e citando Arthur Rimbaud) "quando se quebrar a escravidão infinita da mulher, quando ela viver por ela e para ela, o homem — até hoje abominável — tendo-lhe dado a alforria ".
A reedição em Portugal
daquele que é talvez, para muitos de nós, o mais famoso livro de Simone de
Beauvoir, continua a ser a prova indiscutível da necessidade de dar a conhecer
ou relembrar no mundo actual os princípios de igualdade de género e
solidariedade que a autora sempre defendeu e que constituíram o seu universo
filosófico. Para aqueles que como eu recordamos os dias que marcaram o
desenrolar dos movimentos de Maio de 68, nos quais os jovens reclamavam a
igualdade como direito universal, têm presente a sua intervenção nessas
manifestações, juntamente com Sartre, ambos lutando sempre por aquilo que eram
as suas convicções mais prementes, um mundo onde o indivíduo não seja apenas um
número mas onde todos possam ser activos intervenientes na história colectiva.
E não é por acaso que trazemos aqui Sartre. É que a vida amorosa que ambos
tiveram não os obrigava a qualquer submissão de qualquer das partes e muito
menos da mulher em face do homem. Coerente com o seu pensamento, Simone vivia
aquilo que defendia e que expressa com veemência nesta obra agora reeditada. Ela
não deseja ser apenas o ”outro”, como os homens consideraram a mulher ao longo
de toda a história, como se houvesse e de facto assim acontecia na prática um
ser diferente, provavelmente ao qual eram atribuídas funções que eles não
queriam desempenhar nem podiam, assim julgavam. Simone defende que esse outro
existe mas apenas se justificar o ser autónomo com a condição feminina. Esta
errada condição feminina não é, não pode ser, como era considerada, referente
apenas à natureza biológica da mulher, até aí imposta pela sociedade, mas muito
mais do que isso, a nota autónoma da diferença que pode caracterizar uma
classe. Simone era de facto na sua vida privada, na vida amorosa, na actividade
literária que não se cansava de exercer, em livros e revistas várias, o
verdadeiro ícone do feminismo e que ainda perdura nos dias de hoje, onde apesar
do muito que a mulher já alcançou nos últimos anos, a igualdade plena no que
diz respeito aos poderes que lhe possam ser conferidos na sociedade ainda não
foi alcançada. E por isso, esta reedição da sua obra máxima, “o Segundo Sexo”,
se tornará certamente num êxito que não pode passar despercebido às gerações
actuais. A destruição dos mitos que foram criados, das concepções mas também
dos erros defendidos até por nomes famosos da literatura mundial, os princípios
filosóficos mas também a psicanálise, o que pode significar realmente a mulher,
o que ela é e pode representar nas sociedades modernas, mas que na maior parte
dos casos ainda não alcançou, tudo isso ali está. Acompanhamos todo o caminho
percorrido pela condição feminina desde o Antigo Egipto, Atenas ou Roma, até à
Idade Média onde a mulher conservou ainda alguns privilégios, a dicotomia do
cristianismo, a chegada do Renascimento, a Idade Moderna ou a simples
conquista do direito de voto e os primeiros movimentos feministas soviéticos. O percurso, ao longo de todas essas épocas e etapas, vivido pela chamada condição feminina é descrito e estudado minuciosamente. Ela que até escreve no início desta
sua obra ter hesitado “muito tempo em
escrever um livro sobre a mulher. O tema é irritante, principalmente para as
mulheres. E não é novo.” conseguiu fazer uma análise histórica e filosófica
da presença da mulher em toda a série de actividades que desempenhou ou a
fizeram desempenhar mas sempre com carácter de subalternidade e não na
igualdade de poderes e direitos pela qual lutará até aos seus últimos dias.
Desmontando o mito milenar do "eterno feminino", uma frase estabelece uma ruptura irreversível: "Ninguém nasce mulher, torna-se mulher". A dualidade dos sexos nunca deveria ter levado a que o homem saísse sempre o vencedor sobre a mulher. Simone de Beauvoir e a sua obra muito contribuíram, a par de outras corajosas personalidades, para que este estado de coisas tenha melhorado mas a plenitude da sua razão ainda não foi alcançada. E por isso existem uma série de movimentos feministas, um pouco por todo o lado, até nos países mais radicais do extremo oriente onde a luta prossegue mas onde uma jovem de 17 anos, a paquistanesa Malala Yousafzai, defendendo, entre outros direitos, precisamente os da educação das jovens meninas, lutando até às mais atrozes consequências, consegue obter o Prémio Nobel da Paz em 2014. Todos julgamos e desejamos que esteja em vias de se formar uma nova concepção da sociedade baseada na democracia plena, uma aliança do socialismo e da liberdade. Porque socialismo e liberdade são inseparáveis. E como diz Simone “ uma volta ao passado não é mais possível nem desejável. O que se deve esperar é que, por seu lado, os homens assumam sem reserva a situação que se vem criando; somente então a mulher poderá viver sem tragédia. Então poderá ver-se realizado o voto de Laforgue: "Ó moças, quando sereis nossos irmãos, nossos irmãos íntimos sem segunda intenção de exploração? Quando nos daremos o verdadeiro aperto de mãos?" (…) "Então ela será plenamente um ser humano (e citando Arthur Rimbaud) "quando se quebrar a escravidão infinita da mulher, quando ela viver por ela e para ela, o homem — até hoje abominável — tendo-lhe dado a alforria ".
Desmontando o mito milenar do "eterno feminino", uma frase estabelece uma ruptura irreversível: "Ninguém nasce mulher, torna-se mulher". A dualidade dos sexos nunca deveria ter levado a que o homem saísse sempre o vencedor sobre a mulher. Simone de Beauvoir e a sua obra muito contribuíram, a par de outras corajosas personalidades, para que este estado de coisas tenha melhorado mas a plenitude da sua razão ainda não foi alcançada. E por isso existem uma série de movimentos feministas, um pouco por todo o lado, até nos países mais radicais do extremo oriente onde a luta prossegue mas onde uma jovem de 17 anos, a paquistanesa Malala Yousafzai, defendendo, entre outros direitos, precisamente os da educação das jovens meninas, lutando até às mais atrozes consequências, consegue obter o Prémio Nobel da Paz em 2014. Todos julgamos e desejamos que esteja em vias de se formar uma nova concepção da sociedade baseada na democracia plena, uma aliança do socialismo e da liberdade. Porque socialismo e liberdade são inseparáveis. E como diz Simone “ uma volta ao passado não é mais possível nem desejável. O que se deve esperar é que, por seu lado, os homens assumam sem reserva a situação que se vem criando; somente então a mulher poderá viver sem tragédia. Então poderá ver-se realizado o voto de Laforgue: "Ó moças, quando sereis nossos irmãos, nossos irmãos íntimos sem segunda intenção de exploração? Quando nos daremos o verdadeiro aperto de mãos?" (…) "Então ela será plenamente um ser humano (e citando Arthur Rimbaud) "quando se quebrar a escravidão infinita da mulher, quando ela viver por ela e para ela, o homem — até hoje abominável — tendo-lhe dado a alforria ".
SIMONE DE BEAUVOIR
MAL-ENTENDIDO EM MOSCOVO
Com a reedição de “O Segundo Sexo” a
editora lançou também uma célebre novela de Simone de Beauvoir que esteve para
fazer parte da sua colectânea La Femme
Rompue (A mulher
destruída, em português) mas tal não aconteceu e de facto, escrita quase
vinte anos depois da edição em França da sua grande obra, esta pequena novela ajuda-nos
eventualmente a perceber melhor como vivia esta grande escritora, completamente
de acordo (como aliás era de esperar) com as ideias e pensamentos que defendia.
Mal-entendido em Moscovo conta-nos alguns momentos, ou melhor alguns dias,
vividos por um casal de professores reformados, atravessando aquele período de
crise habitual dos muitos anos passados em conjunto. Mas após
as primeiras páginas da sua leitura facilmente depreendemos que ele, André, o
marido, é nem mais nem menos que Jean Paul Sartre e ela, Nicole, é Simone de
Beauvoir. Portanto o desenrolar das diversas situações, numa viagem à União
Soviética, são verdadeiros retratos autobiográficos. E, sem querer sentir algum
pecadilho por entrar na intimidade da vida do casal, o que aliás Simone
certamente, ao escrevê-la, teve a plena consciência de que o estava a permitir,
esta sua novela, riquíssima de diálogos que nos transmitem efusivamente a
maneira de pensar dessas duas grandes figuras, dá-nos a sensação de estarmos
ali a viver com eles, o encontro e o desencontro por palavras ditas ou apenas
pensadas por cada um. Em Moscovo eles têm consigo a presença de Macha que seria
a filha do primeiro casamento de André (Sartre teve várias ligações
nomeadamente com jovens soviéticas não sendo oficialmente garantido que delas
tivesse filhos). Mas na novela, a existência de Macha serve para entre os dois
elementos do casal se instalar o possível ciúme que aliás parece ter sido mais
verídico no caso de Sartre do que de Simone. Nicole também teria – na novela –
um filho chamado Philip que ficara em Paris. Um e outro caso irão ser aproveitados na
novela para a defesa ou ataque, género André: “…nunca pensei que ela te
aborrecia.”. Nicole: “mas é uma terceira pessoa entre nós”. André: “É o que
muitas vezes penso quando trazes o Philip para passar o fim-de-semana
connosco.” Um exemplo apenas do muito que se passa neste Mal-entendido em Moscovo. E também a
desilusão de um e do outro face às diferenças notadas com o que teria sido em
viagens anteriores e esta de agora à então União Soviética, o que de facto também
é auto-biográfico, embora mais de Simone do que de Sartre. Aliás esta óptima
novela prende-nos de tal forma que só paramos no final. Por isso – e não só –
ela aqui está como merece e porque tanto significa do pensamento e vivência da
autora. Bem merece este lugar no meu Amor pelos Livros, ela, Simone de Beauvoir,
que confessava “ter uma paixão violenta pelos livros”. Voltaremos, assim o
creio, a tê-la aqui na esperada reedição de outra obras.
Para ler um excerto
desta obra clique aqui
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