Não se pretende fazer aqui crítica literária. Sou um cidadão do mundo que sente amor natural pelos livros. Na minha casa as paredes estão cobertas pelos livros. E falo com eles ou melhor eles falam comigo como se fossemos grandes amigos. Revelam-me os seus segredos e os conhecimentos dos seus autores ou contam-me histórias onde se inscrevem valores humanitários universais.

São ensaios, romances, contos e narrativas, peças de teatro, clássicos e modernos, mas também sobre o ambiente ou tecnologias úteis no nosso dia-a-dia. São obras que fazem parte da minha paixão pelos livros e que humildemente indicamos como sinal e guia para quem deseje conhecer conteúdos que julgamos dignos e fiáveis.

E porque desejo transmitir uma análise que embora pessoal seja minimamente correcta nem sempre consigo manter a actualidade que seria normal se a falta de tempo por abraçar outras actividades não o impedisse. Mas aqui estarei sempre que possa.

Gil Montalverne

CENAS DA VIDA AMERICANA

Clara Ferreira Alves


Confessando o quanto admiro a escritora e jornalista Clara Ferreira Alves, tomo a liberdade, que nunca fiz, de reproduzir a cinta que cobre esta sua obra para início do que farei o possível por dizer sobre o seu conteúdo. De facto está ali tudo o que a autora nos vai contar. “Estes são os dias da América: o poder do dinheiro, os bastidores da política, as malhas da guerra, o quotidiano dos que não têm voz”. Clara Ferreira Alves, como aliás tem referido por várias vezes nos seus artigos e em intervenções televisivas, conhece bem a América, o nome pelo qual são designados os Estados Unidos da América. Percorreu todos os estados de uma costa à outra, desde 1980 até aos dias de hoje. Em muitas das cidades permaneceu durante vários dias e teve a possibilidade de avaliar o modo de viver do povo americano, não deixando de notar que desde Reagan até aos dias de hoje com Trump, os presidentes não conseguiram fazer desaparecer o grande fosso que divide ricos e pobres. Afinal a América da Liberdade, o país tantas vezes desejado por aqueles que acreditavam que ali iriam encontrar um futuro radioso para si e muitas vezes também para a família, vive do poder do dinheiro infiltrado nos bastidores da política. Chegavam pobres, pensando poder ali viver com alguma dignidade e segurança quando na maior parte das vezes ficavam pior do que nos seus países de origem. Clara Ferreira Alves encontrou muitos desses emigrantes em pequenas cidades do interior de muitos dos estados. O sonho americano que eles imaginavam que iriam encontrar naquele país não chegara a concretizar-se. A autora analisa, investiga as possíveis razões e leva-nos a percorrer como era a América nos dias de Reagan, dos Bush, de Clinton, mesmo de Obama e até como vai ela com o actual Trump. Assistimos ao verdadeiro desenrolar dos episódios conhecidos durante esses vários mandatos. Mas esta obra consegue descrever-nos com a exactidão da veia jornalística, não só o como, mas também a razão porque aconteceram as inúmeras cenas que apenas todos nós conhecíamos das notícias que foram sendo divulgadas durante todos esses anos. E sem qualquer sombra de dúvida é possível concluir como afinal estas cenas da vida americana nos revelam ser sempre o poder do dinheiro dos mais ricos que, como sempre, acaba por vencer e deixa sem o mínimo conforto os que não conseguiram alcançar o ambicionado sonho americano, velhos vagabundos, drogados, negros e brancos desempregados e também mulheres. Mulheres, muitas mulheres sem família, sem filhos, que os maridos abandonaram para tentar qualquer outro caminho que aquela América lhes negou, deixando-as em perfeita miséria, sujeitas aos piores sacrifícios que nunca pensaram ter de suportar. É verdade que a autora não nega, como afirma peremptoriamente, que a América salvou a Europa em momentos da história em que tudo parecia ruir neste nosso continente. E de tal modo isso foi verdade que o século XX chegou a ter o nome de século americano. Em Nova York persiste uma vida turbulenta que nos dá a ideia de que tudo vai bem. As grandes salas de espectáculo enchem-se das elites que sempre persistiram. E os bons restaurantes não faliram, pelo menos por enquanto. É lá que uma certa gentalha se reúne para combinar as grandes fraudes. Central Park ainda existe. Aliás sempre existiu. Mas de dia é uma coisa diferente do que ali se passa de noite. Não é seguro. Por lá proliferam os vagabundos e assaltantes. Nós próprios assistimos a isto quando lá estivemos certa vez em serviço. E já havia gente sentada nos degraus das portas de saída de muitas casas, estendendo a mão, pedindo uma esmola que cairia ou não no chapéu colocado à sua frente. Assistimos a isto em muitas ruas não muito longe do centro de Nova York. Também eu fiquei desiludido nesse tempo, antes dos anos que Clara Ferreira Alves nos conta nesta sua obra que reúne muitos dos artigos que publicou desde 1980. E parece que no essencial nada mudou. Estas suas “Cenas da Vida Americana” servem de facto para ficarmos a conhecer melhor o que é a América. Não conseguimos transmitir aqui com muito pormenor a mais pequena ideia de uma tão vasta história. Apesar do que nós próprios podermos ter visto, tudo o que sabíamos da América ficou agora totalmente transformado naquilo que constitui a verdade vivida por Clara Ferreira Alves. Claro que termina com a análise possível do que acontece presentemente com Trump, o homem que segundo ela “quer destruir o sistema, o amante da força bruta e da guerra total, o ditador dos media, o Goebbels de uma ópera bufa, a crueldade claramente vista”. Aconselhamos vivamente esta leitura.

Para ler alguns excertos desta obra clique aqui