Não se pretende fazer aqui crítica literária. Sou um cidadão do mundo que sente amor natural pelos livros. Na minha casa as paredes estão cobertas pelos livros. E falo com eles ou melhor eles falam comigo como se fossemos grandes amigos. Revelam-me os seus segredos e os conhecimentos dos seus autores ou contam-me histórias onde se inscrevem valores humanitários universais.

São ensaios, romances, contos e narrativas, peças de teatro, clássicos e modernos, mas também sobre o ambiente ou tecnologias úteis no nosso dia-a-dia. São obras que fazem parte da minha paixão pelos livros e que humildemente indicamos como sinal e guia para quem deseje conhecer conteúdos que julgamos dignos e fiáveis.

E porque desejo transmitir uma análise que embora pessoal seja minimamente correcta nem sempre consigo manter a actualidade que seria normal se a falta de tempo por abraçar outras actividades não o impedisse. Mas aqui estarei sempre que possa.

Gil Montalverne

PROFESSOR FERNANDO CATARINO
Homenagem pelos 80 Anos.

Decidimos trazer aqui a nossa homenagem pelo 80º aniversário do Professor Fernando Catarino, Professor Catedrático Jubilado do Departamento de Biologia Vegetal da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, celebrado no passado dia 9 de Novembro. Este atraso da minha intervenção neste espaço em relação ao dia do seu aniversário deve-se ao facto de ele ter recebido nesse dia uma homenagem num espaço da Internet que constituiu sem dúvida a maior homenagem desse género feita até hoje neste meio de comunicação. Tratou-se de um aniversário que fará história na Internet. Assinando uma mensagem celebrativa escrita por dois grandes jornalistas estende-se um grande Mar de abraços de parabéns onde participaram muitas centenas de amigos e admiradores (também lá estou, como é natural) em Portugal e no mundo inteiro e que continua a aumentar até ao próximo dia 30. Maria Augusta Silva e Pedro Foyos, os dois jornalistas que construíram esta ideia original naquele que pode ser considerado um dos sites de maior interesse no panorama nacional, pelos conteúdos de natureza literária, científica e intelectual que nele estão patentes decidiram – e muito bem – que esta sua brilhante homenagem constituísse uma surpresa, que só fosse conhecida pelo homenageado a partir das 09:00 desse dia. Como facilmente se compreende, eu não poderia colocar-me na singeleza da minha intervenção em paralelo com a importância do que se passava no “Casal das Letras” para cujo link chamamos a vossa atenção.

É também a segunda vez que neste meu espaço Amor pelos Livros, insiro uma excepção de um texto meu que não se refere a um livro. Mas engana-se quem assim pensar. O Professor Fernando Catarino, com quem convivi na Faculdade de Ciências e no seu Jardim Botânico de que foi director, daí nascendo uma grande amizade com a qual tive a honra de por ele ser presenteado e que até hoje se mantêm, é ele próprio um verdadeiro livro. Tal como aconteceu a muitos dos seus alunos, eu, que o não fui porque o meu curso tinha sido escolhido erradamente como mais tarde viria a verificar, aprendi conhecimentos de um volume tal que nunca encontraria ao ler vários compêndios de Botânica e mesmo de outras áreas. Seriam necessárias muitos milhares de páginas para descrever tudo o que me transmitiu. E ainda tenho esperança de que um destes dias alguém se disponha a reunir em livro os muitos milhares de textos que publicou, as muitas conferências que fez, as muitas intervenções em colóquios e acontecimentos relacionados naturalmente com a Biologia Vegetal, mas não só.

Já seria mais difícil transcrever todos os ensinamentos que nos transmitia durante os passeios com os seus alunos ou admiradores à Serra da Arrábida, percorrendo aqueles lugares ainda virgens da intervenção humana. E se recordarmos uma das suas frases emblemáticas afirmando que “A coisa que eu tenho mais interessante, como pessoa, é, desde que me lembro, ter sido marcado por uma enorme curiosidade pelo saber, um enorme gozo em perceber as coisas” teremos de admitir que tudo isso ele conseguiu transmitir-nos. À medida que ia sendo satisfeita a sua curiosidade pelo saber e que ia avançando no “perceber das coisas”, tudo isso nos transmitiu e em muitos certamente fez nascer o mesmo desejo de conhecer mais e mais. Pessoalmente, muito do que eu sei, se é que sei alguma coisa, a ele lhe devo. Um passeio na Arrábida ou em outro Parque Natural, uma simples paragem para observar uns estranhos vestígios deixados num muro do Palácio de Sintra por um certo grupo de líquenes, foram para mim um manancial de conhecimentos que a ele lhe devo. Também lhe devo as palavras elogiosas com que me presenteou no Prólogo do meu livro A Nave Maravilhosa, que até hoje considero o livro da minha Vida, publicado pelo Circulo de Leitores tendo igualmente feito a apresentação dessa mesma obra na ocasião do seu lançamento. Com uma energia sem limites e o encanto das suas palavras esclarecedoras, continua ainda hoje a partilhar os seus conhecimentos em muitos encontros regulares organizados por núcleos de pessoas interessadas em aprender e conhecer os incontáveis segredos desta Natureza onde estamos inseridos e que alguns, como ele, sempre lutaram por conservar.

Parabéns Querido Amigo e obrigado Querido Professor Fernando Catarino por tudo o que nos ensinou e soube partilhar connosco.

Para conhecer a grande homenagem que foi feita no dia 9, como dissémos pelo “Casal das Letras”, carregue neste link
UM MUNDO INFESTADO DE DEMÓNIOS
A Ciência como uma Luz na Escuridão
Carl Sagan
Ed. Gradiva
Para que ninguém se assuste, o subtítulo é colocado também na capa (tal como aconteceu na edição original). Carl Sagan, o professor, cientista e investigador que certamente todos recordam, pelo menos pelo seu livro Cosmos, (que se seguiu à série de televisão homónima, vencedora de um Emmy e de um Prémio Peabody) considerado o livro de divulgação científica em língua inglesa mais vendido de sempre, vem precisamente nesta sua obra denunciar a ideia de que o mundo esteja infestado de demónios. Prémio Literário Los Angeles Times para Ciência e Tecnologia, ele desmonta toda uma série de mitos que ao longo dos tempos e mesmo no presente têm servido, por vezes com as mais malévolas intenções, destinadas a dominar as mentes mais desprotegidas do conhecimento. E é precisamente a ciência que tem sido essencial para resolver as possíveis dúvidas. Num exemplo muito simples que ele cita numa das páginas, a rotação do girassol de acordo com a posição do astro-rei foi considerada noutros tempos um milagre natural. Até que a ciência descobriu que o movimento da flor do girassol é devido a um tropismo, isto é, deve-se a um movimento que é executado através de acção hormonal que acontece na própria planta e orientado em relação a um estímulo externo, neste caso a luz solar, chamado fototropismo. Carl Sagan percorre nas páginas do seu livro os diversos períodos da nossa história e vai descrevendo os vários demónios que foram criados, ou melhor, inventados pelos homens. No mundo antigo, a crença nos demónios era generalizada. Ele relembra a própria crença existente em grandes figuras como Sócrates ou o seu discípulo Platão que consideravam que a sua criatividade tinha origens demoníacas. E até Aristóteles aceitava que os sonhos tinham origem em demónios. Que dizer então da gente simples dos povos dessas épocas? As figuras demoníacas estavam presentes para onde quer que se voltassem. E os demónios e os mitos foram ficando. Mesmo à medida que o tempo passava e alguns desapareciam, logo outros tomavam o seu lugar. O autor vai citando com enorme precisão os mais variados documentos histórico-culturais em que baseou o seu estudo. E assim vamos percorrendo o caminho da criatividade demoníaca. É espantoso como crenças ou religiões de todos os géneros sentiram necessidade de criar entidades, pretensamente maléficas, para justificar o que não era ainda compreensível ou não tinha sido descoberto. E não foram poucos os que chegaram a espalhar como credível aquilo em que eles próprios não acreditavam. Razões muito obscuras para eventualmente exercerem domínio sobre os seus seguidores. Tudo isso é analisado com muito pormenor e com a referência às obras consultadas pelo autor ou à sua experiência pessoal. E desse modo conclui que não é de admirar que a ideia tenha prevalecido e até ainda subsista hoje em algumas das pretensões da chamada pseudociência. Carl Sagan aborda com muita profundidade o caso dos discos voadores, óvnis e extraterrestres que falsos cientistas chegaram a defender. Lembra-nos as estranhas visões presenciadas por muita gente nos mais diversos locais do mundo, mas sobretudo na América, que constituem um prolongamento da ideia da existência de demónios pois se alguns, como o célebre “ET”, não tinham más intenções, outros teriam vindo anunciar catástrofes mundiais e até mesmo o fim do mundo. Por mais estranho que nos possa parecer, a tendência para a irracionalidade criativa persiste. E apenas a verdadeira ciência a poderá combater. É a tal Luz na Escuridão. Por isso o autor aproveita também para falar no modo como hoje em dia se processa o ensino e se preparam as mentes dos jovens. Muito do que se passa nos tablóides ou é difundido por noticiários sensacionalistas pode ter, esse sim, um efeito maléfico para o aparecimento de futuras superstições. Mas o oportunismo político continua a deixar que esse aparatoso divertimento tenha lugar. Em nome da paz defende-se o nuclear. E este é um demónio da era moderna. Enfim, da invenção de Satanás aos testemunhos visionários do monstro de LochNess ou à defesa do nuclear, o caminho é necessariamente longo. Não nos é possível aqui descrever a variedade enorme e surpreendente dos casos citados. Richard Dawkins, ex-professor da Universidade de Oxford e grande escritor de divulgação científica britânico, escreveu que “recorrendo a um manancial de referências históricas e culturais, assim como à sua vivência pessoal, Sagan demonstra com enorme clareza e rigor que a tentação da irracionalidade é não apenas um erro cultural crasso como um salto perigoso para a escuridão, que põe em risco as nossas liberdades mais básicas”. E como Sagan não deixa de referir com grande insistência a actualidade das tecnologias que endeusam actividades como o nuclear, Dawkins interroga-se se não “estaremos no limiar de uma nova era de obscurantismo e superstição”. E até confessa que gostaria de ter sido ele a escrever este livro. Como não foi, diz que o mínimo que pode fazer é aconselhá-lo aos seus amigos. O mesmo convite dirigimos nós aos que nos estão a ler neste espaço.

Para ler um excerto desta obra clique aqui.