Não se pretende fazer aqui crítica literária. Sou um cidadão do mundo que sente amor natural pelos livros. Na minha casa as paredes estão cobertas pelos livros. E falo com eles ou melhor eles falam comigo como se fossemos grandes amigos. Revelam-me os seus segredos e os conhecimentos dos seus autores ou contam-me histórias onde se inscrevem valores humanitários universais.

São ensaios, romances, contos e narrativas, peças de teatro, clássicos e modernos, mas também sobre o ambiente ou tecnologias úteis no nosso dia-a-dia. São obras que fazem parte da minha paixão pelos livros e que humildemente indicamos como sinal e guia para quem deseje conhecer conteúdos que julgamos dignos e fiáveis.

E porque desejo transmitir uma análise que embora pessoal seja minimamente correcta nem sempre consigo manter a actualidade que seria normal se a falta de tempo por abraçar outras actividades não o impedisse. Mas aqui estarei sempre que possa.

Gil Montalverne

A TEORIA DE TUDO
Stephen Hawking

No momento em que se exibe em todo o mundo o filme que esteve nomeado para os Óscars, com o mesmo nome, será perfeitamente normal que os espectadores recorram  à leitura da sua famosa obra para melhor conhecerem como aquele que é considerado um dos maiores cientistas da actualidade, o maior físico teórico desde Einstein, revela ao mundo a sua Teoria de Tudo. Conhecida a sua vida difícil mas corajosa, lutando contra uma doença que desde a juventude lhe foi destruindo progressivamente todos os músculos do corpo, deixando-o fisicamente inoperante, apenas conservando a prodigiosa capacidade da sua mente brilhante, é quase irónico que tenha dado ao mundo o conhecimento de todas as leis que regulam o universo. Ultrapassando tudo o que até então tinha sido defendido e afirmado pelos seus antecessores no domínio da astrofísica e mesmo dos seus pares na física teórica, Stephen Hawking conseguiu chegar a conclusões sobre as origens do universo que abalaram grande parte do mundo científico. E o mais espantoso neste seu livro é conseguir explicar teorias tão complexas com exemplos simples, alguns retirados da nossa vida quotidiana. Aliás a divulgação da ciência sempre foi considerada por ele com a preocupação de poder ser compreendida não apenas pelos cientistas mas pelo público em geral, mesmo por aqueles que apenas tenham o mínimo das noções eventualmente adquiridas durante a sua formação ou na simples leitura de alguns textos de divulgação científica. Este seu livro, editado entre nós em 2010, mas de novo com grande procura no mercado, em parte pelo sucesso obtido pelo filme da sua biografia e o Óscar com que foi galardoado o actor que desempenha o difícil papel do cientista, Stephen Hawking apresenta-nos uma série de 7 capítulos que denomina lições onde, conforme nos diz, “tenta resumir o que pensamos ser a história do universo, do Big Bang aos buracos negros”. Mas recorda-nos igualmente o que pensavam Aristóteles já em 340 a.C. e depois Ptolomeu, Copérnico, Galileu, Kepler, Newton e mais recentemente Hubble. Naturalmente diferentes e de acordo o que era conhecido em diversas etapas da nossa civilização, vamos acompanhando o que foram os seus estudos e investigações sobre a Terra e o espaço que nos rodeia, tudo aquilo que ficou para a história como uma espécie de caminho para a descoberta e compreensão do Universo, de que somos apenas uma pequeníssima parte. O problema principal que nos mais recentes séculos se colocava era a questão do início do Universo. Mas também do nosso lugar nele e de tudo o que existe muito para além do que observamos quando em determinados momentos olhamos para aquilo a que resolvemos chamar céu. Se nos interrogamos sobre o modo como tudo começou, também estamos interessados em saber para onde caminhamos. Stephen Hawking dá-nos uma visão muito precisa e que facilmente absorvemos de toda a série de observações que foram feitas e dos fenómenos detectados, mas também das consequentes interpretações feitas pelos diversos cientistas ao mesmo tempo que se desenvolviam motivações da parte das mais variadas religiões. Para estas, tudo era mais facilmente explicado pela existência de um ser superior ou criador e o problema estava resolvido. Mas a ciência, baseada na observação directa que hoje é possível com os instrumentos mais sofisticados e no desenvolvimento proporcionado pelas mais que provadas leis da física moderna e da matemática aplicada, foi progressivamente apresentando uma série de teorias para conseguir explicar como se processou a formação do universo, a sua expansão e o caminho que conduzirá ao seu destino. É toda essa série de teorias parciais que Hawking nos vai explicando ao longo das páginas deste livro, na tentativa de ser encontrada uma teoria unificada. Esse foi também um trabalho sem sucesso tentado por Einstein mas nesse tempo faltavam ainda certos conhecimentos que só ultimamente têm vindo a ser descobertos. Stephen Hawking consegue revelar-nos com pormenor o estado actual do caminho para encontrar a Teoria de Tudo. No final da leitura desta sua obra saberemos qual a situação actual e aos leitores será dada a conclusão. Estaremos ou não a caminho de uma Teoria de Tudo? O autor considera que a partir do momento em que for descoberta uma teoria completa todos seremos capazes de a perceber na sua generalidade e participar na discussão das razões porque o universo existe. E se descobrirmos a resposta, teremos obtido o triunfo máximo da razão humana. Porque então – afirma Hawking – conheceremos a mente de Deus. São muitos os que dizem que isto pode parecer um paradoxo vindo de um ateísta confesso, como é do conhecimento público. Sendo um dos maiores cientistas da actualidade que tornou a astrofísica acessível a todo o público é igualmente paradoxal e irónico que tudo aquilo que pensa e descobre esteja alojado no interior de um cérebro que pertence a um corpo aprisionado numa cadeira de rodas mas comunica connosco através de um computador que recebe o sinal enviado por um sensor colocado nos óculos que por sua vez reconhece um pequeníssimo movimento no seu olhar. E foi aliás ele próprio que o concebeu para depois ser montado pela Intel e assim,  apesar da sua debilidade física, ocupou até há pouco tempo a cátedra de Isaac Newton da Universidade de Cambridge, sendo actualmente Director do Departamento de Matemática Aplicada e Física Teórica. Trabalhos, livros e conferências são conseguidos desta forma que, parecendo simples, é ao mesmo tempo extraordinária, tal como a sua mente prodigiosa que nos permite ler obras como esta que aqui deixamos.

Para ler um excerto desta obra clique aqui

Nota do autor deste site: Já depois desta obra, Stephen Hawking escreveu juntamente com Leonard Mlodinow outra mais recente (2010) ainda não editada em Portugal. “The Great Design” (O Grande Desígnio) é de novo uma tentativa para esclarecer as dúvidas que ainda subsistem. Uma história apenas do Universo ou várias histórias do que convivem em simultâneo? Já o lemos mas esperemos pela edição em português para o colocar aqui.

AUSCHWITZ – UM DIA DE CADA VEZ
Westher Mucznik

Auschwitz nunca mais! É este tipo de frase que apetece dizer, aliás utilizado em diversas ocasiões quando queremos expressar o nosso desejo de que determinados acontecimentos não se repitam. E quando neste caso, essa palavra maldita significa um dos maiores horrores que os homens praticaram, levando ao sofrimento e à morte de mais de um milhão de pessoas, homens, mulheres e crianças, vivendo os seus últimos dias – se é que a isso se pode chamar viver – sujeitos às maiores privações, desde a fome às torturas, espancamentos, sem qualquer tipo de assistência mas muito deles fazendo parte ainda de diabólicas experiências médicas, que os conduziam a males ainda maiores, quase duvidamos que essa gente que originou o gigantesco holocausto, na tentativa de destruir os que não eram da sua “raça” ariana, eliminando sobretudo judeus e ciganos, pudesse pertencer à espécie humana. Nunca na história da humanidade se perpetraram tais crimes, tão numerosos e com tanta violência. Os relatos que nos chegaram, através dos sobreviventes, ao longo dos anos que se seguiram à sua libertação, deram-nos a conhecer a forma como tais crimes eram cometidos, o que se passava nas câmaras de gás, nos esgotantes trabalhos forçados para ajudar a força de guerra nazi, nas casernas onde se amontoavam no total desconforto como se de animais se tratassem, centenas de presos, muitas vezes sem saber se estariam vivos no dia seguinte. Mas cada testemunho que nos chega, cada história contada, cada retrato da miserabilidade a que foram sujeitos esses muitos milhões de seres humanos é sempre algo que nos revolta ainda mais. Se é que é possível ser maior a revolta que já sentíamos. No passado dia 27 de Janeiro cumpriu-se mais vez o que está estabelecido para comemorar de 10 em 10 anos a libertação de Auschwitz em 1945. Foi há 70 anos portanto que o Exército soviético entrou pelo chamado Portão da Morte para retirar os poucos sobreviventes que ainda ali se encontravam depois dos nazis terem levado a quase totalidade, muitos deles acabando por morrer nas marchas de retirada. Nesta cerimónia, que contou com a presença de 11 líderes de países europeus e delegações de mais de 40 países, assistiu-se pela televisão à forte carga emotiva com que reagiram naturalmente os cerca de 300 sobreviventes que ali voltaram para prestar a sua homenagem, muitos deles a familiares e amigos mas não só, a todas as vítimas que perderam a vida naquele conjunto de campos na região sul da Polónia. E, tal como foi salientado pelos oradores, os próximos aniversários não contarão certamente, devido à sua avançada idade, com o número de sobreviventes que ali estiveram desta vez. Foram as suas vozes e de outros que já partiram que nos permitiram conhecer até que ponto foi possível tal capacidade humana para a extrema humilhação, desprezo e genocídio de outros seres, biologicamente seus iguais mas diferentes nas suas crenças ou religiões. E é aqui que todos devemos centrar a nossa atenção. É necessário não esquecer, não esquecer nunca, lembrar nas escolas e nos livros, para que passe de geração em geração e possamos garantir com toda a certeza: Auschwitz nunca mais! Também nós próprios desejámos trazer aqui mais um livro que saiu nestes últimos dias precisamente nesse contexto. Para que não se esqueça. E mais uma vez, reparámos que afinal ainda não sabíamos tudo. O que a autora, aliás já com outras obras publicadas sobre Auschwitz, nos faz chegar em relatos não só de certo modo reunidos pelas características do conteúdo em locais determinados mas também cronologicamente organizados de modo a ser conseguido um historial dos factos desde o nascimento destes campos até ao momento da libertação. Perante todo o potencial de sofrimento e dor é também a luta pela sobrevivência, abortar a gravidez para não morrer mãe e filho(a), até mesmo escolher entre a morte de dois ou apenas um, praticando o crime de que mais tarde virão a sentir remorsos. É reagir por vezes, lutando pelo que parece desnecessário face à morte anunciada para salvar a faculdade de ser alguém, onde a cada dia em vez de um “…preferia morrer” (…) decidir “lutar para sobreviver”. Da primeira à última página, adquirimos uma estranha vivência de tanto sofrimento e tanta dor, atingindo a suprema humilhação que desce ao mais imundo do carácter de quem a perpetrou. E o que agora lemos só foi possível porque existem pessoas como a autora, aliás com responsabilidades em vários organismos que se dedicam a perpetuar a memória do Holocausto, que responderam ao pedido feito pelos sobreviventes: “Não nos esqueçam!”. Não esqueceremos nunca, assim o creio. E, se outras razões não existissem, bastaria isso para dar também este meu humilde contributo de aqui deixar o convite para que leiam este livro de Esther Muchznik. Como é hábito vai ser possível proporcionar ao visitante deste espaço a leitura de alguns excertos dele. E posso afirmar que nunca me foi tão difícil a escolha. Porque na verdade todo o livro merece ser lido. Há mais, muito mais para ser conhecido. Bem-haja quem nos permitiu que assim fosse.


Para ler um excerto desta obra clique aqui